Entrevista - Revista Qualidade
- O QUE MUDOU NOS ÚLTIMOS MESES PARA QUE O
INVESTIMENTO EM CAPITAL DE RISCO TIVESSE SIDO CATAPULTADO EM
PORTUGAL NOS ÚLTIMOS MESES? QUE OBSTÁCULOS AINDA FALTA ELIMINAR
PARA QUE A INDÚSTRIA GANHE MAIOR DINAMISMO E EXPRESSÃO?
Apesar das medidas favoráveis que ao longo dos últimos dois anos
têm vindo a ser adoptadas em prol do sector de capital de risco
em Portugal, maxime um enquadramento jurídico e fiscal favorável
à dinamização da actividade e a constituição de um Fundo de
Sindicação de Capital de Risco que veio permitir alavancar a
actividade dos operadores de capital de risco, o estado de
maturidade deste sector em Portugal - e em geral na Península
Ibérica – continua a registar índices de significativo atraso
quando confrontado com outros países que integram o Mercado
Europeu, ao nível do cumprimento de critérios determinantes para
a ocorrência de investimento, tal como se poderá constatar
através da análise do quadro a seguir apresentado.

Face ao exposto considero essencial que a
alteração dos factores inibidores do desenvolvimento da
actividade de Capital de Risco em Portugal, sobretudo nas fases
seed e startup, passe pela verificação das seguintes condições:
- Os operadores de capital de risco assumam uma cada vez maior
transparência e regras de “Corporate Governance” de forma a que
a citada informação não seja circunscrita aos próprios gestores
das Sociedades de Capital de Risco e seus accionistas e passe a
ser acessível ao nível dos Empreendedores, business angels,
imprensa especializada, Universitários e Organismos Públicos.
Aliás, a profunda evolução ocorrida nos mercados financeiros e
tecnológicos e a consequente diminuição da rentabilidade do
sector após a loucura dos finais da década de noventa, acrescido
do interesse global em aumentar a transparência empresarial,
assim o impõem;
- As Sociedade Gestoras de Fundos de Pensões e entidades
Seguradoras passem a considerar, a exemplo do que ocorre nas
economias anglo-saxonicas, que os investimentos no Capital de
Risco nacional podem contribuir para o aumento da rentabilidade
das suas carteiras, e deste modo sejam incitadas a afectar a
estes investimentos montantes que contribuam para o aumento de
liquidez e diversidade dos operadores de Capital de Risco;
- Seja criado um adequado enquadramento jurídico-fiscal - a
exemplo do que está a ocorrer na generalidade dos países
europeus – favorável à dinamização das redes de Business Angels,
em função da importância que estes investidores informais
assumem na transformação de empreendimentos inovadores em
negócios bem sucedidos;
- Os grandes Grupos Económicos nacionais constituam um efeito
demonstração na criação de entidades de Corporate Venture
capazes de aumentar o nível de investimentos em projectos,
assentes na Inovação e Criatividade, sendo estes comummente
apresentados por jovens com elevada formação cientifica e
tecnológica.
- Uma adequada divulgação, junto de empresários e
Empreendedores, não só das vantagens e possibilidades que esta
alternativa de financiamento permite, mas também pela
sensibilização para os aspectos intangíveis - como a
experiência, o acesso a uma rede de contactos nacionais e
internacionais, e, principalmente, a credibilidade conferida às
“Ideias” – os quais na minha opinião assumem tanto ou mais valor
do que todas as vantagens que os recursos financeiros podem
proporcionar;
- Uma maior consciencialização por parte dos Empreendedores para
a necessidade de profissionalizarem os seus processos de
angariação de Capital de Risco. Para conseguir financiamento, o
empreendedor necessita, em primeiro lugar, de saber o que
efectivamente os investidores pretendem, pelo que será
totalmente imprudente e desprovido de razoabilidade aproximar-se
destes sem que tenha tentado obter primeiro informações sobre a
forma como actuam no mercado, e, para isso, nada melhor que
entrar em contacto com entidades especializadas nessa
actividade, a exemplo do que os Empreendedores fazem quando têm
um problema e consultam o Advogado, com vista à obtenção dos
esclarecimentos adequados para esse efeito.
- Criação de fundos de Capital de Risco Universitários,
potenciando o acesso directo das Universidades a fundos de
capital semente que lhes permita aplicar os resultados da
pesquisa científica em novos negócios e/ou produtos. Veja-se, a
exemplo, o Fundo de Capital de Risco Universitário constituído
em Espanha, em Agosto do ano passado, com a participação de 16
Universidades, tendo sido dotado com doze milhões de euros, com
o objectivo de participar como capital semente em áreas de alto
crescimento e iniciativas empresariais de base tecnológica no
âmbito universitário;
- Aproveitar os investimentos (mais de 544 milhões de Euros) que
o nosso país precisa de realizar na área da Sociedade da
Informação, como alavanca para a dinamização das start-ups que
apresentem produtos ou serviços que possam vir a satisfazer
parte das necessidades relacionadas com o E-Government, a
exemplo do que ocorre nos EUA onde a NASA é a alavanca para as
start-ups americanas, ao afectar às mesmas cerca de 20% do seu
orçamento anual;
- Realização de um Concurso Nacional de Planos de Negócios
-devidamente orçamentado que possa dar sequência aos inúmeros
concursos de ideias já lançados em Portugal, mas
insuficientemente capitalizados- destinado a incentivar a
criação de empresas inovadoras no âmbito das tecnologias de
inovação. Denote-se que, em França, este Concurso, que possui um
orçamento anual de 30 milhões de Euros, já vai na sua quinta
edição e permitiu, em quatro anos, constituir 466 empresas e
criar mais de 2300 postos de trabalho.
- QUAL TEM SIDO O PAPEL DAS SCR ESTATAIS NA
DINAMIZAÇÃO DA ACTIVIDADE DE CAPITAL DE RISCO? ESPERA-SE QUE A
ATENÇÃO QUE ESTE GOVERNO PRETENDE DAR À ÁREA TECNOLÓGICA
(NOMEADAMENTE O CHAMADO CHOQUE TECNOLÓGICO) FAÇA SURGIR
OPORTUNIDADES PARA AS SCR E PARA O EMPREENDEDORISMO?
Este sector já há muito ansiava por medidas concretas e
edificantes em detrimento de pseudo reformas legislativas mais
ou menos mistificadoras da realidade, e favoráveis meramente no
plano formal.
A PME INVESTIMENTOS , Sociedade de Capital de Risco com capitais
maioritariamente públicos, ao adoptar nos últimos seis meses uma
estratégia de actuação baseada em critérios de full risk , i.e.,
na aposta em jovens empreendedores com projectos com potencial
de crescimento e valorização, em detrimento de critérios
próprios da banca tradicional, permitiu a um significativo
número de empresas de base tecnológica- biotecnologia,
telecomunicações, software, aquacultura, medicamentos –
possuírem uma adequada estrutura de capitais próprios para
fazerem face aos seus planos de investimentos.
Os mais de sete milhões de euros investidos por esta SCR
pública, em áreas onde a falha de mercado é mais do que evidente
e reconhecida por todos, em oito empresas em fase seed e
start-up, bem como em acções e iniciativas com o principal
intuito de contribuir para a criação de um ambiente favorável ao
crescimento e à transmissão de empresas, tem contribuído para o
estado actual do capital de risco nacional permitindo antever
que o acesso a esta poderosa ferramenta de desenvolvimento
empresarial deixe de ser sinónimo de burocracia, conservadorismo
e de difícil acesso aos jovens empreendedores.
No que diz respeito à segunda parte da questão gostaria de
acreditar que as boas ideias que se encontram subjacentes ao
programa do Governo e nomeadamente à aposta do Senhor Primeiro
Ministro, no desenvolvimento do capital de risco e do
empreendedorismo em Portugal, sejam implementadas com prontidão
e eficácia por parte dos Organismos Públicos, actualizados nos
seus valores, de forma actuante e interventiva , na linha aliás
do que a actual Administração da PME INVESTIMENTOS tem vindo a
realizar, de forma a que possamos assistir ao aparecimento de
novas empresas e de novos empreendedores, apoiados por uma
indústria de capital de risco mais pró-activa e dinâmica, que
criem a riqueza necessária ao aumento do bem estar da população
portuguesa.
- ESPERA-SE A ENTRADA, EM BREVE, DE NOVAS SCR
NO MERCADO NACIONAL?
O Capital de Risco em Portugal ainda é uma Indústria Jovem, com
alguns problemas estruturais e culturais , que se debate com a
existência de uma oferta pequena em termos de bons gestores e de
bons empreendedores condicionando assim, apesar das melhorias
ocorridas no enquadramento jurídico e fiscal, a entrada de novas
SCR, quer nacionais quer internacionais, no mercado nacional.
Acredito no entanto que esta situação se possa alterar a curto
prazo, caso os empreendedores de sucesso, que já vamos tendo em
Portugal, tenham mais visibilidade como modelos a seguir,
funcionando como efeito demonstração para que muitos jovens que
hoje preferem trabalhar para as filiais das multinacionais
instaladas no nosso País - com benefícios evidentes para estas,
conforme o demonstra o facto de, em 2003, só uma dessas
multinacionais ter exportado para todo o mundo mais de um milhão
de horas de massa cinzenta de engenheiros portugueses,
porventura promitentes empreendedores …- sejam encorajados a
criar as suas próprias empresas e desenvolver novas tecnologias
excitantes, captando dessa forma o interesse dos investidores de
capital de risco , quer estes sejam nacionais ou internacionais.
- AS CAPITAIS DE RISCO JÁ ESTÃO MAIS
SENSIBILIZADAS PARA INVESTIR, MENOS RESISTENTES AO RISCO DO QUE
QUANDO, HÁ CERCA DE UM ANO, FIZEMOS O PRIMEIRO BALANÇO?
Infelizmente continuo a constatar uma apetência pouco
significativa por parte das SCR instaladas em Portugal para o
investimento em projectos em fase de desenvolvimento inicial
independentemente dos mesmos revelarem grandes perspectivas de
crescimento e valorização e satisfazerem reais necessidades dos
clientes.
Com excepção da PME INVESTIMENTOS – um bom jogador não faz uma
equipe de futebol…- e de mais um ou outro investidor de capitais
maioritariamente Públicos é com bastante preocupação que encaro
a atitude passiva e conservadora dos principais Operadores
privados, nomeadamente os de estrutura accionista ligada aos
Grupos Financeiros, que infelizmente não se encontram a
aproveitar as oportunidades que as pequenas start ups
portuguesas podem gerar com a criação de inovações técnicas e no
desenvolvimento e upgrading dos seus produtos e serviços tão
decisivos para a geração de lucros e conquista de um mercado
cada vez mais competitivo e exigente.
Facto este tanto mais difícil de perceber quanto sabemos que
hoje as descontinuidades - em tecnologia, demografia, estilos de
vida, regulação geopolítica - que se estão a verificar no Mundo
em que vivemos continuam a proporcionar uma excelente plataforma
de lançamento para ideias novas e radicais, com particular
destaque para soluções inovadoras que resolvam as reais
necessidades dos clientes, identificando novos mercados com
elevado potencial de crescimento.
Apesar de compreender que este comportamento não pode ser
dissociado do facto de a banca comercial portuguesa ter
detectado sempre mais oportunidades em financiamentos ao crédito
ao consumo e à aquisição de habitação do que ao nível da banca
de empresas e consequentemente no financiamento a longo prazo,
estou convicto que a aposta, por parte das SCR detidas pelo
sistema bancário, no financiamento de empresas que assentam a
sua estratégia de desenvolvimento com base na criatividade e na
inovação, para além de contribuírem para o aumento da
produtividade, criação de emprego e desenvolvimento de uma
cultura vibrante e empreendedora na economia nacional, poderão
vir a gerar recompensas interessantes que acabarão por vir a ser
aproveitadas - caso não se verifique a curto prazo uma inflexão
de comportamento - por entidades estrangeiras que possuam nas
suas estruturas executivos com um perfil e espírito empresarial
mais desenvolvido e adaptado a apoiar as empresas suas
participadas a atingir o sucesso comercial com as suas novas
tecnologias.
- O QUE ESPERA DESTE 5.º VENTURE CAPITAL IT?
Considerando a forte aposta da Gesventure em conseguir este ano
mobilizar até Portugal figuras de grande vulto mundial, como
sejam a Professora Mannie Manhong Liu, (Vice-Presidente do
Instituto de Venture Capital da China), João Paulo Poiares
Baptista (Presidente da Associação Brasileira de Capital de
Risco), François Bernardeau (Presidente da Natexis, actualmente
a maior Sociedade de Capital de Risco francesa), Chris Curtis (o
Guru canadiano do Empreendedorismo, presente pela terceira vez
em Portugal) Gerry Cater ( Wilmer Cutler Pickering Hale and
Dorr) e Julie Logan (Simfonec), para além de especialistas
portugueses de reconhecido mérito, designadamente o Engº Mira
Amaral, perspectivamos que a abrangência deste Congresso venha a
descompartimentar-se, extravasando o perímetro de abordagem e
discussão circunscrito aos quatro cantos da sala do Congresso,
por forma a repercutir importantes reflexos na Economia
nacional, numa altura em que as empresas portuguesas precisam de
estimular agressivamente a sua criatividade interna para
melhorar os seus níveis de desempenho nos mercados nacionais.
Além disso, esperamos que um número maior de Empreendedores,
previamente seleccionados pela Gesventure para participação no
“Elevator Pitch”, venham a alcançar financiamento que permita o
crescimento das suas empresas, através das reuniões privadas com
Sociedades de Capital de Risco, Business Angels e Grupos
Económicos que irão estar presentes ao longo dos dias de
Congresso, contribuindo assim com o seu exemplo para que em
novas edições o número de potenciais candidatos venha a
reproduzir-se significativamente.
Espero assim, que os resultados alcançados na Edição deste ano
continuem a ser manifestamente reconhecidos, quer por parte de
entidades públicas quer privadas, para que as mesmas continuem a
introduzir nas iniciativas por si desencadeadas a metodologia
aplicada nos nossos Eventos, com todos os efeitos positivos daí
decorrentes para os jovens Empreendedores portugueses.
Respostas efectuadas por
Francisco Banha
CEO
Gesventure – Desenvolvimento de Novas Tecnologias, Lda
Em 24.04.05
Fonte:
Revista Prémio
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