Voo picado
Existem 80 milhões de observadores de aves em todo o mundo e uma
empreendedora portuguesa quer trazê-los para a Madeira. Em pouco
mais de um ano, e apenas com recurso a capitais próprios,
Catarina Fagundes, uma ex-técnica do Observatório de Turismo do
arquipélago, conseguiu 30 clientes. Agora, em parceria com três
hotéis e uma agência de viagens, acaba de ser seleccionada para
a British Birdwatching Fair
POR LUIS BATISTA GONÇALVES

© Filipe Viveiros |
»»
Em Portugal, o fenómeno ainda não tem muitos seguidores mas, no
estrangeiro, o número de observadores de aves ronda os 80 milhões.
E quando um deles se apercebe que há uma espécie nova a sobrevoar
uma determinada área, não perde tempo. Em poucos segundos, essa
informação circula por SMS e, muitas vezes, em poucas horas, já um
grupo de birdwatchers está, de binóculos em punho, olhos pregados
no céu, em busca do exemplar descoberto. Segundo o perfil traçado
por algumas das entidades que têm procurado caracterizar esta
comunidade, a maior parte destes observadores pertence à classe
média/alta, possui formação superior e faz férias em função das
aves que pretende observar.
De acordo com os números recentemente apresentados numa
conferência em Lisboa, 70 por cento dos birdwatchers europeus e 87
por cento dos americanos fazem, pelo menos, uma viagem por ano com
esse objectivo. E são precisamente estes eco-turistas que o
projecto Madeira Birdwatching Experience, que participará em
Agosto na British Birdwatching Fair, um dos maiores certames
mundiais do género, pretende atrair para o arquipélago. Resultante
de uma parceria entre a
Madeira Wind
Birds, uma empresa de animação eco-turística especializada
nesta área, três hotéis de quatro e cinco estrelas e uma agência
de viagens, este consórcio comercializa vários programas com
percursos diferentes. O pacote de um dia inteiro possibilita a
observação de aves desde o amanhecer até ao pôr-do-sol. A visita
de meio dia alia a observação de espécies endémicas de avifauna a
uma caminhada por entre a vasta flora da região.
Quem não resiste aos chamamentos da freira da Madeira, uma das
aves marinhas mais ameaçadas da Europa, tem à disposição
expedições nocturnas. O mais completo de todos é, no entanto, o
programa de cinco dias, que inclui uma viagem ao santuário
ornitológico das Ilhas Selvagens, onde existe a maior colónia de
cagarras do mundo e onde acorrem algumas das mais importantes
colónias de aves marinhas do Atlântico. Quem não tem tanto tempo,
pode sempre aproveitar o circuito que faz o triângulo das ilhas,
uma viagem de dois dias que inclui uma passagem pelas Ilhas
Desertas e por Porto Santo antes de regressar ao Funchal.
Foi com estes pacotes que Catarina Fagundes, a empreendedora que
está por detrás do projecto Madeira Wind Birds, atraiu, desde
Fevereiro do ano passado, 30 clientes. Destes, metade são
ingleses. Os restantes são alemães, austríacos, belgas,
finlandeses, franceses, holandeses, irlandeses e suecos. Na altura
em que se lançou nesta aventura, esta ex-técnica do Observatório
de Turismo da Madeira, entretanto extinto, não estava sozinha no
negócio. Tinha mais dois sócios que, à sua semelhança, se
dedicavam à empresa em part-time.
Diferentes formas de encarar a realidade empresarial forçaram,
contudo, a uma separação. Catarina Fagundes optou por despedir-se
da Direcção Regional de Turismo da Madeira, onde entretanto
coordenava vários estudos, para se assumir como empresária a tempo
inteiro e é nessa condição que tem participado em conferências e
seminários de apresentação a potenciais investidores, em busca de
financiamento que lhe permita fazer um voo picado e expandir o
negócio.
Expansão do negócio implica investimento de 50 mil euros
Para investir em carrinhas que possam transportar mais turistas,
em material óptico que estes possam usar e em mais guias que os
possam acompanhar, Catarina Fagundes precisa de 50 mil euros. Só
para a Madeira, porque se encontrar um investidor interessado em
ajudá-la a voar um bocadinho mais alto, a diversificar a
actividade e a exportar o negócio para território nacional – uma
hipótese que não põe de parte –, serão necessários bem mais.
"Podemos fazer isto à escala nacional, visto que em Portugal
[Continental] não há assim nada de especial nesta área", garante a
empresária que, apesar das potencialidades do negócio, ainda não
conseguiu cobrir o investimento que até agora fez. "Mas
conseguimos muitos contactos e conseguimos colocar o nosso site –
que tem uma média de 100 visitas diárias – nas primeiras páginas
dos principais motores de pesquisa", afirma.
As potencialidades do negócio
foram reconhecidas pela Associação Comercial e Industrial do
Funchal (ACIF), que lhes atribuiu o prémio "Empreendedores
do Futuro 2003". Entre 29 candidatos, o projecto Madeira
Wind Birds foi um dos oito vencedores da primeira edição
desse concurso mas, à semelhança de muitos dos programas de
incentivos concedidos a quem se está a iniciar no mundo dos
negócios, de pouco ou nada lhes serviu essa distinção.
"Recebemos material informático no valor de 3 750 euros, o
qual tivemos que escolher de uma reduzida lista de
equipamento, onde nem sequer constava um PC normal. E só nos
chegou um ano depois, em Novembro ou Dezembro de 2004",
lamenta. |
 |
© Madeira Wind
Birds |
|
Mais decisivo foi, no entanto, o apoio logístico
prestado pelo Centro de Empresas e Inovação da Madeira (CEIM),
localizado no Madeira Tecnopolo, o pólo tecnológico e científico
do Funchal. É nesta incubadora de empresas, numa sala com
telefone, Internet e apoio administrativo, alugada a um preço
mais reduzido do que os que pratica o mercado, que a Madeira
Wind Birds está sedeada.
Directores hoteleiros contestam apoio à observação de aves
À semelhança do CEIM, a Associação de Promoção da Madeira também
tem procurado estimular e dinamizar o tecido empresarial do
arquipélago, tendo comparticipado 50 por cento de um orçamento
de 39 895 euros, que será usado para promover a participação na
Birdfair 2005, fazer vistas de reconhecimento, adquirir bases de
dados e para publicitar o projecto Madeira Birdwatching
Experience na revista Birds, uma publicação inglesa com mais de
600 mil assinantes.
Contudo, no terreno, nem todos têm apoiado entusiasticamente a
ideia. Muitos directores de hotéis e de agências de viagem
têm-se mostrado interessados em vender os pacotes da Madeira
Wind Birds. Outros ficam a olhar para Catarina Fagundes como se
esta fosse uma ave rara. "Temos hotéis que acham isto uma
patachada – regionalismo que se refere a algo indecente e
simultaneamente ofensivo – e fazem comentários do género
'Passarinhos? Mas agora a Associação de Promoção dá dinheiro
para passarinhos? Não têm mais nada que fazer?'. Aqui, as coisas
ainda são um bocadinho fechadas. É difícil penetrar no mercado",
lamenta.
Atrair investimento por parte de potenciais financiadores tem
sido outro calvário. "Durante um ano, na Madeira, não consegui
nada. Em território continental, em três dias, já tenho alguns
contactos de pessoas que se mostraram interessadas", confessou
ao PortalExecutivo, no final de uma apresentação a várias
sociedades de capital de risco, que teve recentemente lugar em
Lisboa. Neste momento, decorrem conversações com um potencial
investidor. "Ainda não está nada garantido, mas vamos no bom
caminho", confessa Catarina Fagundes, que depois de um arranque
mais turbulento acredita que é desta que vai abrir asas e voar,
como fazem as aves que costuma levar os seus clientes a
observar.pe
Participação na British Birdwatching Fair já está a ser
preparada |
É caso para dizer que são
poucas mas boas. No Arquipélago da Madeira existem apenas
43 espécies de aves nidificantes. "No entanto, estas são
de grande importância, sendo 19 por cento espécies e
subespécies endémicas da Madeira e 37 por cento da
Macaronésia [o espaço geográfico que compreende os
arquipélagos da Madeira, dos Açores e das Canárias]", pode
ler-se no site da Madeira Wind Birds.
O pombo trocaz e a freira da Madeira estão entre as aves
mais procuradas, mas estão longe de ser as únicas. "Há
observadores que têm check lists e têm que vir ao
arquipélago se as quiserem completar", garante Catarina
Fagundes, directora da empresa de animação eco-turística
que, juntamente com os hotéis Choupana Hills e Quinta do
Furão, a estalagem Casa Velha do Palheiro e a agência de
viagens Windsor, integra o projecto Madeira Birdwatching
Experience.
Depois de vários meses em lista de espera, a organização
da Birdfair 2005 garantiu-lhes recentemente a presença no
certame, que terá lugar. |
Fonte:
Portal Executivo
|